quinta-feira, 10 de julho de 2008

Perguntas e respostas francas e diretas: conheça Soninha Francine

VISÃO POLÍTICA / POR QUE SER CANDIDATA

Soninha, qual é a sua visão política e o que você pretende se candidatando à Prefeitura de São Paulo?

Acho que a segunda parte da resposta ajuda a responder a primeira... O que eu pretendo, em primeiro lugar, é disputar a Prefeitura da cidade discutindo grandes temas, pensando a cidade a curto, médio e longo prazo.

Analisar honestamente as possibilidades de solução de seus problemas, sem nenhum constrangimento ou obrigação de falar bem disso ou daquilo, e mal deste ou daquele, isto é: posso reconhecer iniciativas bem-sucedidas em governos anteriores, independentemente do partido, tanto quanto falar de boas práticas em qualquer outro lugar do Brasil ou do mundo.

E sem prometer ser a sabe-tudo, resolver tudo, ter todas as boas idéias do mundo, mas assumindo o compromisso de discutir incansavelmente o que for mais complexo, mais polêmico, com especialistas e os diretamente envolvidos (por exemplo, soluções de habitação são sempre complicadas, têm muitas inter-relações - com meio ambiente, trabalho, renda etc.).

Precisamos criar ou fazer funcionar muitos instrumentos de participação e controle, descentralizar a gestão, respeitar as peculiaridades dessa cidade imensa. Meu objetivo é a cidade, e tenho certeza que a administração tem de estar acima de disputas partidárias. O que não exclui uma visão política da administração, mas a política é meio e não fim.

Sobre a "visão política" propriamente dita: sou de esquerda. Não acredito no mercado como promotor de desenvolvimento e justiça; na competição como melhor forma de organizar a sociedade.

Sei que não podemos suprimi-lo, extinguir o capitalismo, mas o Estado tem o dever de corrigir distorções, combater o desequilíbrio, oferecer oportunidades, promover modos de colaboração, cobrar responsabilidades. Incentivar determinadas posturas, onerar ou punir outras.

A administração municipal tem uma responsabilidade e um poder imenso nesse sentido, ao mesmo tempo em que é muito limitada em outros - infelizmente, ficamos dependentes de uma política econômica sobre a qual temos pouco poder de interferência (o que fazer quanto aos juros e a taxa da câmbio, além de espernear?).

Enfim, não é fácil explicar "visão política" em uma resposta, mas acho que ela fica evidente na análise do meu mandato, da minha postura diante de determinados temas da política e da sociedade - e faço questão de deixar sempre muito claro como eu ajo e penso, mesmo que isso tenha conseqüências arriscadas em termos eleitorais. É muito fácil acompanhar meus passos, pela internet e em entrevistas. Creio que isso também seja uma demonstração de que tipo de política eu sou.

A decisão em disputar um mandato no Executivo tem alguma relação com fato de não você não ter conseguido implementar várias de suas idéias no Legislativo?

Mais ou menos. Algumas coisas eu não conseguiria fazer no Legislativo porque não são da nossa alçada. Não é uma frustração pessoal. São atribuições diferentes. Eu amei esse tempo que eu tive e que eu ainda tenho aqui como parlamentar, com tudo que teve de sacrificante e frustrante. É sensacional essa experiência de ser parlamentar na Câmara Municipal de São Paulo, apesar de tudo o que me queixei e ainda vou me queixar até o fim do mandato. A frustração é inevitável e, às vezes, é surpreedente. Mas é diferente. O Executivo tem um raio de ação maior, mais direto, mais palpável. Muita coisa que a gente consegue aprovar no Legislativo, através de projeto de lei ou de inclusão no orçamento, quem vai agir de fato é a outra esfera. Não é que eu esteja procurando um consolo para uma frustração pessoal. É só vontade de ser útil de uma outra forma e em um outro lugar.

Qual o maior desafio da cidade de São Paulo?

São Paulo é um (mau) exemplo de um dos piores defeitos do Brasil: a desigualdade. É a cidade mais rica e mais pobre da América Latina. Tem todos aqueles extremos que estamos cansados de conhecer - uma das maiores frotas de helicópteros do mundo e uma extensão de metrô ridícula para uma metrópole... Um número impressionante de cirurgias plásticas e tanta gente perdendo dentes por falta de cuidado. Milhões de celulares e tão poucos livros por habitante; tantas faculdades e tamanha deficiência na escolarização de adolescentes...

Reduzir essas distâncias é particularmente difícil pela combinação de alguns fatores muito presentes em nossa cultura nos últimos tempos: o consumismo como método para alcançar a realização (ter algo para ser alguém); o imediatismo (endividar-se em vez de poupar); a tendência a colocar o patrimônio, conforto e segurança individuais muito acima do interesse coletivo (vide insulfilmes e "bairros privados"); o estresse e agressividade decorrentes disso tudo.

Para completar, a total descrença na política e políticos, fazendo com que toda ação do poder público seja vista com desconfiança e com que poucos estejam dispostos a abrir mão de qualquer coisa em nome do bem-estar geral. Desconfiamos uns dos outros – partidos, governos, empresas, sindicatos, ONGS, movimentos sociais, mídia, indivíduos... Pior que isso: às vezes sabotamos uns aos outros em nome de nossos "objetivos estratégicos". Essa resistência - a baixar a guarda e contribuir, participando generosamente da cidade – talvez seja o maior problema a ser enfrentado pelo próximo governante.

A ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL

Primeiramente, como vê o governo do nosso atual prefeito? Quais são os pontos positivos e negativos na prefeitura de Gilberto Kassab?

Acho que tem qualidades. Alguns dos pontos positivos: a corajosa lei Cidade Limpa, uma idéia que muitos urbanistas defenderam por muito tempo mas nunca tinha havido uma ação tão decisiva para diminuir a poluição visual na cidade; a atuação na área ambiental, com o investimentos em Parques Lineares (ao longo de córregos) e ações para desocupação de áreas de manancial, entre outras coisas; na área da Cultura, a recuperação das bibliotecas, o Centro de Juventude da Cachoeirinha e a Virada Cultural. A reestruturação de algumas carreiras do serviço público, como na Educação, e a conclusão da primeira fase do Expresso Tiradentes.

Mas a prefeitura não conseguiu resolver alguns gargalos muito sérios: o congestionamento nos corredores de ônibus e a má qualidade do transporte em alguns lugares, especialmente na Zona Sul; a coleta seletiva, que não avançou quase nada; a demora para se conseguir marcar uma consulta ou exame na rede de Saúde; e a oferta de saídas para a população de rua.

Quais são os principais problemas da cidade de São Paulo? Quais as primeiras medidas a serem tomadas para evitá-los?

Se nós atacarmos ao mesmo tempo duas áreas principais, ajudamos a diminuir a pressão sobre várias outras. Essas áreas são a de mobilidade (trânsito, transporte e locomoção não-motorizada) e do uso e ocupação do território - basicamente, a distribuição de moradia e trabalho pela cidade. Não podemos conviver com tanta desigualdade.

No centro da cidade, temos toda a infra-estrutura urbana instalada, concentração de trabalho e até equipamentos públicos com capacidade ociosa - como escolas com poucos alunos. Na periferia (e nas cidades vizinhas), temos verdadeiros bairros-dormitório, onde as pessoas só tem a moradia e nada mais. Precisamos repovoar o centro da cidade e promover o desenvolvimento sustentável nas periferias.

Com esses dois movimentos, você diminui a pressão por equipamentos na periferia, melhora o trânsito, melhora a saúde... Para fazer esse repovoamento do centro, há vários instrumentos do Plano Diretor Estratégico; é preciso regulamentá-los e colocar logo em prática.

Quais são as suas pretensões ao assumir a Prefeitura da cidade?

Fazer uma gestão que pensa no macro, nas estruturas, nos sistemas, sem jamais esquecer dos "detalhes" - do impacto na vida de cada pessoa. E atacar rapidamente os problemas urgentes, as situações insuportáveis (esgoto a céu aberto, por exemplo) sem esquecer do planejamento para daqui a 10, 20 ou 50 anos. E diminuir todas as distâncias na cidade: entre moradia e trabalho; entre pobres e ricos; entre a população e o poder público.

Como enxerga a situação atual da violência em São Paulo? Qual o principal fator que faz com que o índice de violência nesta cidade aumente?

São vários fatores combinados, mas um dos principais é a urbanização deficiente, que fez com que houvesse enormes bolsões de miséria. Lugares com baixíssimo atendimento das necessidades e direitos fundamentais, onde, na ausências das instituições, para a vigorar a lei do mais forte; onde o crime passa a ser um modelo de sucesso financeiro e de afirmação; onde as perspectivas de realização de sonhos e projetos de vida são muito diferentes de outros lugares da cidade.

Nós precisamos levar urbanização a todos os lugares da cidade e oferecer oportunidades, perspectivas e a chance de um projeto de vida. Precisamos oferecer respeito à vida para ensinar respeito à vida.

Moradores da cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, enfrentam grandes problemas no atendimento público hospitalar com o crescimento de doentes infectados pelo mosquito da dengue. Como se encontra a questão da saúde na cidade de São Paulo? O atendimento público de São Paulo suportaria a quantidade de pacientes com dengue encontrados no Rio de Janeiro?

É sempre difícil lidar com uma situação de epidemia, mas não tenho dúvidas de que o sistema de saúde no Rio é pior do que o nosso - mais desorganizado, mais atingido por desonestidades e desvios. A Saúde em São Paulo tem problemas sérios também; como disse, a demora para se conseguir uma consulta com um especialista ou para a realização de um exame diagnóstico é inadmissível. Em alguns lugares, faltam Unidades de Saúde, mas em outros faltam profissionais nas unidades.

Houve avanços na informatização do controle de distribuição de medicamentos e marcação de consultas, mas ainda há muitos "defeitos" no atendimento ao público. E existem áreas nas quais a carência é ainda maior - na Saúde Mental, por exemplo. A rede de atendimento precisa aumentar muito.

Quais são os planos na área da educação? Conforme dados do Saresp 2007, os alunos avaliados das escolas públicas de todo o Brasil sofrem grande dificuldade no aprendizado de matérias como a matemática. O que a prefeitura pode promover para a ampliação do conhecimento, na área de exatas, dos alunos e ter melhor rendimento nas matérias em geral oferecidas nas escolas públicas da cidade?

Precisamos primeiro garantir o básico: que todos os alunos da rede tenham o número correto de aulas, com professores comprometidos com a qualidade no ensino, bem preparados, bem remunerados e com estrutura de apoio adequada - que vai das instalações da escola à segurança no seu entorno. E tem de haver a avaliação dos profissionais segundo o seu desempenho, com gratificações para aqueles que atingirem as metas estabelecidas.

A participação dos pais via Conselho de Escola também é importante e deve ser incentivada. O currículo deve ser enriquecido com atividades extra-classe, como acontece nas boas escolas particulares. E é necessário montar um programa forte de recuperação, com a parceria de entidades se for o caso, para corrigir a defasagem que já existe entre os alunos que estão com um aproveitamento muito menor do que seria o esperado em suas séries.

Existem planos de ampliação do mercado de trabalho para estudantes do ensino médio, superior e aprendiz caso seja eleita prefeita da cidade de São Paulo?

Embora a prefeitura tenha alcance limitado quando se trata de gerar empregos - a conjuntura da economia nacional é muito determinante - há iniciativas que podem ser tomadas pela administração. Nós pensamos em criação de vagas para estágiários e aprendizes na própria administração, e também em mecanismos de incentivo para o setor privado. Por exemplo, a concessão de incentivos fiscais para quem oferecer postos de trabalho para jovens recém-formados, em determinada região da cidade ou em determinada atividade. Ou a exigência de adesão à Lei do Aprendiz por empresas que venham a ter contrato com a administração pública.

Que marca gostaria de deixar de sua gestão, caso seja eleita?

Gostaria de deixar duas marcas. A primeira seria uma melhora na vida de pedestres e ciclistas. Hoje existem 300 mil pessoas, no mínimo, que já utilizam a bicicleta como meio de transporte. São 300 mil pessoas entregues a essa selva - e morre ciclista pra cacete. Pelo preço da Ponte Estaiada, que acabaram de construir, você faz um sistema cicloviário de 200 quilômetros na cidade. A bicicleta não polui, não aumenta o efeito estufa, não congestiona a rua, proporciona atividade física e melhora a relação das pessoas com o entorno.

Qual seria a segunda marca?

O fortalecimento da relação das pessoas com o poder local. Tem que fortalecer as formas de participação popular que já existem - como os conselhos de escola, de segurança, de saúde - e criar outras, com representantes eleitos pela comunidade. É o que se chama de ética da co-responsabilidade. O discurso que se ouve há muitos anos é: cobre o político no qual você votou. Só isso? É preciso mais. É preciso saber o que você vai fazer pela cidade na qual você vive.

Você acredita que pode ganhar ou está se cacifando para o futuro?

Entrei com vontade de ganhar. Mas sei ler os gráficos das pesquisas eleitorais. Por outro lado existe a possibilidade de influenciar o debate eleitoral e até os rumos da próxima administração.

Você vem afirmando que entra com poucas chances na disputa pela prefeitura paulistana. Então, para quê disputar?

Na verdade, ver pouca chance é só uma análise realista. Não é um desejo. É claro que eu vou disputar como se eu pudesse ser a prefeita. E se eu ganhar a eleição? Ótimo! Não é como em algumas eleições que as pessoas entram para marcar posições, apenas para fazer o nome, pensando numa outra disputa daqui a dois anos. Entro para disputar e a disputa tem um grande valor em si. É diferente de você ter obsessão para vitória. É claro que disputo uma eleição querendo ganhar, não tenha dúvida. Mas a obsessão pela vitória leva a uma porção de escolhas erradas já na campanha eleitoral porque você já fica pensando que para viabilizar seu nome você precisa dessa aliança, desse reduto, precisa desse campo. Então, você vai agregando várias coisas a sua campanha só para ganhar e você vai diluindo sua proposta, você vai perdendo identidade. Vai deixando as coisas meio confusas. Essa é que é a diferença. Eu já me vejo com um puta tesão assim nos próximos meses, discutindo programa de governo.

Lá no fundo, alimenta a esperança de uma grande virada?

Surpresas acontecem. Ninguém acreditava na Luiza Erundina quando ela se elegeu prefeita. E lá nos Estados Unidos? Pouca gente conhecia Barak Obama.

A SAÍDA DO PT

O que pesou na escolha do PPS como partido a ingressar depois de uma longa temporada no PT?

Desde a primeira abordagem, eles (dirigentes do partido) fizeram uma proposta muito sedutora pra mim que é a garantia de independência. A frase que eu ouvi era, literalmente, "venha ser independente com a gente". Porque a maior dificuldade, em qualquer lugar em que eu estiver, é de ser obrigada a defender o que eu não acredito, entendeu? Ou de ser obrigada a me opor ao que eu concordo.

Eu vejo que, muitas vezes, num partido, é isso que esperam de você: que você deixe uma parte de suas convicções na chapelaria, na entrada e aí, em nome de um projeto maior para daqui a dois anos, você vota contra uma proposta que, em princípio, você seria favorável, sabe?

Então, me conhecendo muito bem, porque acompanharam esse meu tempo aqui de mandato na Câmara, disseram que o que em outros lugares seria problema, no PPS seria muito bem vindo, porque a idéia é debater, a idéia é ter posições claras, fortes. "É de problemas como você que a gente precisa", garantiram. Achei muito legal.

Que "problema" você era no PT e que o PPS precisa?

O próprio presidente do partido, numa coisa já mais específica, disse o quanto ele acha que algumas posições que defendo são muita caras ao partido, muito importantes, uma discussão mais progressista até de alguns temas polêmicos como drogas e aborto.

Ele disse que ninguém no partido é obrigado a concordar com isso, ou seja, provando aquilo que me prometeram: que as pessoas têm o direito de ter idéias diferentes. Mas que a posição do partido é a favor da descriminalização do aborto, por exemplo. Então, sabendo que eu não fujo de temas controvertidos porque isso pode pegar mal pra mim ou coisa parecida, que é uma qualidade que eles desejavam ter com eles. Muito legal.

A conversa nem começaria, caso não tivesse socialista no nome. Claro que eu só cogitaria entrar num partido que fosse de esquerda, para começar. Aí, finalmente, o que foi decidido foi a proposta de disputar a Prefeitura de São Paulo e poder colocar nossos temas, fazendo nosso debate, com uma outra linguagem, com outro formato, diferente das outras campanhas.

Você guarda alguma mágoa do PT ou do presidente Lula?

Mágoa, não! Jamais usaria a palavra mágoa. Aliás, acho que é um problema sério as pessoas tornarem as coisas pessoais, sentimentais, sabe? Não é que não tenha paixão no que a gente faz. Tive milhões de divergências no PT, alguns quebra-paus mais sérios, às vezes, decepções e incoerências, mas sem mágoas, sem carregar ressentimento. Não vou virar a inimiga número um do PT. Só que vou dar minha batalha num lugar legal.

Por que, enfim, a mudança de partido?

Desde que o PT e o governo Lula começaram a ter problemas mais sérios, acusações de desvios graves de conduta, eu fiz parte de um grupo, dentro do PT, que questionava esses desvios e insistia que, se era verdade que "todo mundo faz" coisas assim (Caixa 2, negociação de votos em troca de "favores"), a gente não podia achar normal fazer também.

Eu também questionava algumas escolhas políticas, que não têm a ver com corrupção mas mostram uma distância muito grande do que a gente sempre defendeu. Política de alianças, por exemplo. Vale tudo para ganhar uma eleição - até aceitar o apoio do Maluf?? Como assim???

Enfim, é até difícil enumerar a quantidade de discussões e brigas que a gente teve - até um ponto em que ficou claro, para mim, que PT não queria mais ser o que era antes... Inflexível com algumas coisas das quais vc realmente não deve abrir mão!

O PPS me procurou admitindo que, como todos os partidos, também tem problemas e precisa melhorar. E acreditando que eu sou uma "chata" que cairia bem no partido agora, sendo muito exigente com ele mesmo.

Você é filiada a um partido pequeno, com pequena representação na Câmara. Não terá que fazer muitas concessões para governar?

Não há como ignorar que uma parte do Parlamento só irá apoiar o governo se os seus pedidos forem contemplados - e isso não tem nada a ver com o mérito das propostas. Eu acho possível dialogar, desde que as reivindicações atendam ao interesse público. Se o partido quer indicar alguém para um cargo público em troca do seu apoio, é preciso que o indicado tenha competência. Essa política do “dando que se recebe” está muito arraigada no País, mas tem de ter um limite. O Lula perdeu uma boa oportunidade de escancarar esse esquema quando se elegeu pela primeira vez, com grande apoio popular e simpatia da mídia. Talvez tivesse empacado em algumas realizações, mas teria peitado esse costume ruim. Se você cede, não adianta depois culpar o chantagista.

No jogo político, acha possível vereadores do PSDB apoiarem as propostas de um prefeito do PT, considerando a inimizade entre os dois partidos? Ou vice-versa?

Acho. Aliás, esse foi um dos motivos pelos quais saí do PT. A nossa bancada tinha uma assessoria técnica muito boa, de alto nível, que fazia análises profundas dos projetos em discussão. Mas encerrada a parte técnica, do mérito, vinha a parte da estratégia política, em que se ignorava tudo o que tinha sido dito e alguém concluía: “Vamos votar contra.”

Quem dentro do PT tem as idéias mais diferentes de você?

Setia mais legal falar quem tem idéias mais parecidas... O Zé Eduardo Cardoso, o Paul Singer, o Carlos Neder, o Chico Macena (os dois últimos, vereadores do PT), o Nabil Bonduki (ex-vereador)... Para dar uma resposta mais "em bloco", podemos dizer que o grupo mais próximo da Marta, que esteve na base do governo dela e ficou mais próximo ao grupo conhecido como Centrão aqui na Câmara, é o grupo com o qual eu tenho mais divergências. Até porque foi com esse grupo que eu convivi mais durante o mandato.

Qual é a melhor parte de ser vereadora? E a pior?

A melhor parte é ser capaz de influenciar os rumos da cidade e efetivamente ser capaz de produzir melhoras na vida das pessoas - seja por meio de um projeto de lei, da divulgação de um direito, da fiscalização de um serviço, da promoção de um debate que esclareça as idéias, da influência sobre o Executivo para que tome alguma providência.

A pior é lidar com o desvio de finalidade: com as pessoas que estão na política ou procuram os políticos movidas a egoísmo, ganância ou vaidade; com as decisões políticas que não são tomadas em função dos interesses da sociedade, mas das ivalidades partidárias - como se a política fosse um fim em si, em que o mais importante é derrotar o adversário, custe o que custar.

TRÂNSITO / TRANSPORTE

Um dos principais temas desta campanha à prefeitura deve ser o caos no trânsito, que ameaça parar a cidade. Como pretende abordar o problema?

Há um fator cultural forte em torno dessa questão. O carro próprio é sinônimo de sucesso na vida. Existe uma publicidade pesada, além desse crédito maluco para comprar carro em 90 prestações. Não se fala mais em carro para a família, mas para cada pessoa da família. Fazer o quê? Todo candidato vai dizer que é preciso melhorar o transporte público. Mas não adianta colocar mais ônibus na rua sem planejamento. Veja o caso da Paulista: se você passar lá agora, vai encontrar o corredor de ônibus parado. O melhor seria reduzir o número de linhas e fazer os ônibus andarem. Em outros lugares, é preciso criar linhas.

E o metrô?

É caro e demorado. Deveria ter sido feito com mais agilidade nas últimas décadas. Hoje precisamos de uma solução combinada, com mais metrô, mais obras viárias. A questão do trânsito é um mundo inteiro, que envolve um planejamento muito amplo. Temos ao nosso redor bairros e cidades da região metropolitana que funcionam como dormitórios, com baixíssima atividade econômica e equipamentos públicos e privados deficientes. Isso obriga as pessoas a se locomoverem para a região central de São Paulo: um êxodo diário de milhões de pessoas.

O que acha da idéia de reduzir o tráfego na área central da cidade com o uso do pedágio urbano?

Sou a favor. Numa cultura onde o automóvel é supervalorizado, as pessoas não usam seus veículos apenas por necessidade ou falta de alternativa. Usam porque estão acostumadas, porque não se dispõem a andar 200 metros até o ponto de ônibus, a esperar e a viajar ao lado de outras pessoas. Apóio mecanismos que desestimulem o uso do carro.

Não acha que é preciso primeiro melhorar o transporte coletivo, para depois restringir a circulação?

Os políticos falam isso porque têm medo da reação das pessoas. O pedágio urbano, porém, não é uma invenção política: é uma questão técnica. Ele desestimula o uso do automóvel onde você não pode se queixar da falta de oferta de transporte coletivo, que é exatamente o caso da região central.

BICICLETA

Quando você começou a andar regularmente de bicicleta e o que te fez tomar essa decisão?

Comecei a querer andar de bicicleta há pouco tempo, quando fui convencida de que era mais fácil do que me parecia... Mas só tomei a iniciativa para valer quando roubaram a minha moto e decidi incorporar a bicicleta como uma das alternativas de transporte (junto com ônibus, metrô, táxi e o meu próprio carro).

Agora já comprei outra moto, mas me obrigo a sair de casa de bicicleta pelo menos uma vez por semana, por quatro motivos: porque é meu dia de contribuir com o trânsito (ocupo menos espaço) e a qualidade do ar (bicicleta não polui!); é um modo de fazer atividade física (sou meio sedentária...); é o melhor jeito de verificar as condições oferecidas para os ciclistas na cidade; e, por último: porque em algumas situações chega a ser mais rápido e é mais gostoso.

Para quais lugares você vai de bicicleta? Qual lugar você mais gosta de ir? Qual a diferença entre ir de bicicleta e e ir de carro? O que é melhor? Há algo pior?

Vou para o trabalho, que não é tão longe assim da minha casa (cerca de 4km); vou para algumas reuniões e consultas médicas, qdo dá para pedalar até o destino ou combinar com o metrô (minha bicicleta é dobrável e pode embarcar em qualquer dia da semana); às vezes vou ao cinema ou à casa de algum amigo. De bicicleta, você repara muito melhor no caminho, não tem nem comparação. Vê as casas, as árvores, as pessoas. Claro que também pode ser perigoso, pelas más condições das vias, a falta de estrutura para ciclistas... Pode ser tenso, porque muitos motoristas não respeitam, e cansativo. Mas também pode não ser! Às vezes você fica mais tenso no congestionamento... Pedalar é gostoso.

Por que, quando a gente é criança, andar de bicicleta é tão bom, mas quando a gente fica adulto o bom é carro?

Boa pergunta! A gente é bobo e compra a idéia, vendida por muitos, de que não dá para ser feliz sem um automóvel... E fica preguiçoso e mal acostumado. Esquece o prazer de se deslocar por aí com o próprio esforço, em contato com o mundo externo...

Em países mais desenvolvidos que o nosso, como França ou Holanda, em que mais pessoas têm dinheiro para comprar carro, a bicicleta aparece mais que em nossas grandes cidades? Por que?

Provavelmente porque aqui a gente tem mais forte a idéia do automóvel como símbolo de sucesso, realização, "status". A gente não usa o carro só por necessidade de locomoção, mas também como forma de afirmação.

O que se pode fazer para mudar essa mentalidade?

Em parte, precisamos cultivar outros valores, de modo que as pessoas não dependam tanto da posse e exibição de um objeto, seja ele qual for, para se sentirem felizes e realizadas... E demonstrar que andar de bicicleta (ou de ônibus e metrô) não só não é motivo para vergonha, muito pelo contrário, como pode ser vantajoso e prazeroso. Claro que é preciso melhorar as condições do transporte público e a infra para bicicletas, mas também precisamos fazer campanhas bacanas para incentivar o seu uso. (Na Europa eles também fazem isso).

Muita gente julga menor a questão das bicicletas em meio aos problemas mais "sérios" do transporte público, como a melhoria das estradas ou das ferrovias. O que você acha disso? Porque a questão da bicicleta como transporte precisa ser retomada?

Não há dúvida que o transporte coletivo deve ter prioridade. Mas, pra começar, uma coisa não impede a outra - o investimento necessário em obras viárias para bicicletas é muito, muito inferior aos investimentos nos outros meios de transporte e circulação. E uma bicicleta pode, efetivamente, significar um veículo motorizado a menos no trânsito - o que significa mais espaço na rua, menos poluição, menos gases de efeito estufa (não é à toa que cientistas do Painel de Estudos de Mudanças Climáticas da ONU recomendam o investimento nas bikes!) e a possibilidade de uma convivência mais humanizada.

A bicicleta pode, em muitas situações, substituir um automóvel e o seu uso ser integrado aos transportes coletivos, com a instalação de bicicletários nas estações ou a possibilidade de entrar com ela nos trens ou metrôs. Essa integração de vários meios é a melhor solução para as grandes cidades.

Você acredita que, num mundo tão "corrido" quanto o nosso, o Brasil consiga seguir o exemplo de alguns países e comece a preferir a bike ao invés do carro?

Acredito. Em algumas cidades do interior e do litoral as bikes já são muito usadas cotidianamente - até em uma grande capital como o Rio de Janeiro, que tem uma boa estrutura nas praias da Zona Sul. E mesmo em São Paulo, cujo sistema viário ainda é tão hostil, mais de 300 mil pessoas se locomovem de bicicleta todos os dias. Se a infra melhorar (ciclovias, ciclofaixas, bicicletários nas estações de trem e terminais de ônibus, etc.), mais gente vai querer aderir, com certeza. É barato, é gostoso, não polui... E às vezes é até mais rápido!

Há planejamento político em São Paulo (e até mesmo em outras grandes cidades) quanto ao incentivo à bicicleta em vez do carro/moto, no sentido de diminuir o trânsito, a poluição e melhorar o condicionamento físico da população?

Está começando a haver... As iniciativas ainda são tímidas, mas muito maiores do que alguns anos atrás. Há ciclovias em construção; algumas estações de trem e de metrô têm bicicletários; o metrô e os trens metropolitanos deixam entrar de bicicleta no fim-de-semana... Além disso, tem o Dia Sem Automóvel no calendário oficial, para promover, digamos, um "mutirão" de conscientização. E já tem até medidas da iniciativa privada, como da Porto Seguro (São Paulo) e a Sulamérica (no Rio) - curiosamente, duas empresas que trabalham com seguros de automóveis...

MOTO

Qual foi a sua primeira moto, por que escolheu esse modelo e ainda usa essa mesma moto?

Não foi uma moto, foi uma Vespa... 86, vermelha, partida no pedal. Ela era do meu irmão, que já não era o primeiro dono! Fiquei com ela de 1990 até o ano passado.

Qual sua moto atual, marca, modelo e ano? (se tiver mais de uma, qual é a sua favorita e por quê?)

Tenho uma Honda Bros (NX 150), preta, 2006.

Por que você passou a usar moto. É por causa do problema de trânsito ou algum outro motivo? O uso é mais voltado para o trabalho ou para o lazer?

Por causa de trânsito e distância. Eu morava e trabalhava em Santana (Zona Norte) e estudava na USP (Sudoeste). De ônibus, chegava a levar três horas para estar lá. De carro, uma hora... O trânsito já era insuportável. O único jeito de eu conseguir continuar estudando era ter uma moto. Uso quase todo dia, é meu principal veículo.

Pode contar alguma história ou acontecimento inusitado com sua moto ou scooter? Ela tem alguma característica diferente ou inusitada?

Quando eu tinha a Vespa, ela volta e meia me deixava na mão... E quebrava nos lugares mais inóspitos. Às vezes eu não tinha escolha, largava ali mesmo e chamava o resgate no dia seguinte - ou até dois dias depois. Mas Vespa, felizmente, não era objeto de desejo de ladrão. A ponto de duas ou três vezes a polícia ter me procurado em casa: "A senhora teve uma Vespa roubada?". "Xi, levaram?". "Sim, mas nós localizamos. Foi abandonada ao lado da linha de trem" - que era onde eu tinha deixado!

ASSUNTOS POLÊMICOS

MACONHA

Você já admitiu ter fumado maconha. Isso lhe trouxe problemas?

Sim. Até hoje, em alguns lugares, ainda sou apontada como a maconheira. Mas não me arrependo do que disse.

Isso mudou algo na sua carreira? Você pode comentar sobre? Ainda fuma?

Parei de fumar já faz alguns anos. A visão que as pessoas têm dos usuários é muito distante da realidade... Por isso, naquela discussão sobre a possível mudança da lei, era importante tentar mostrar que maconheiro não é "tudo bandido" ou "tudo doente", como algumas campanhas fazem parecer. O que mudou na minha carreira é que, infelizmente, muita gente só sabe uma coisa a meu respeito: "Sei, é aquela da maconha"... Mas também tem um lado positivo: muita gente deu valor ao fato de eu ter falado a verdade, mesmo que isso pudesse me prejudicar.

ABORTO

E quanto à proposta de descriminalização do aborto?

Apóio. Acho que isso não é assunto para polícia, delegacia e cadeia. É para ser tratado em outras redes, de saúde pública, educação. Isso não quer dizer que sou a favor do aborto. Pela minha prática religiosa - o budismo - não é admissível interromper o desenvolvimento de uma vida humana.

Eu já fiz um aborto, numa época em que tinha deixado de ser católica e ainda não havia encontrado o budismo. Para mim a vida humana é um privilégio - porque o homem tem o poder de refletir sobre suas ações e não viver impelido apenas pelo instinto. Impedir o desenvolvimento dessa vida é uma agressão. Mas a lei que tenta impedir o aborto mais agride do que protege a vida. As conseqüências de abortos clandestinos estão entre as maiores causas de mortalidade materna no Brasil.

GAYS

São Paulo tem a maior parada gay do mundo. Como vê as reivindicações desse movimento?

A melhor frase dos militantes é: “Nem menos, nem mais: direitos iguais.” Você não precisa aceitar, concordar, mas deve respeitar os direitos dessas pessoas. Direito ao trabalho, à educação, a freqüentar os lugares públicos, a andar de mãos dadas com o namorado na rua sem correr riscos de agressão. O combate à discriminação tem de ser política pública.

Quais são suas propostas para a comunidade LGBTI como candidata à prefeita?

Muitas das coisas que a gente defende são de esfera federal, então, alguns direitos básicos pelos quais eu luto estão fora do alcance. Mas dá pra fazer política municipal de igualdade. No combate à discriminação, por exemplo, queremos tratar do tema na escola. Primeiro com os professores e demais servidores, depois com os alunos e suas famílias. Para isso, é preciso elaborar um programa com uma metodologia que inclua oficinas, seminários e publicações cuidadosas de combate à discriminação.

É preciso também fazer campanhas educativas na mídia para promover a inclusão. Porque hoje existem pessoas que não conseguem continuar seus estudos por causa da perseguição, do deboche e até mesmo da ameaça física.

Temos que garantir o respeito à diversidade no ambiente escolar. Esse drama escolar é muito observado no meio das travestis, por exemplo. Eu conheço gente que saiu da escola, principalmente no segmento das travestis e transexuais, e hoje não tem como voltar a estudar nas turmas de aprendizado de jovens e adultos oferecidas pela prefeitura por meio do EJA (Ensino de Jovens e Adultos). É preciso promover decisivamente a inclusão de transexuais e travestis que deixaram os estudos por enfrentarem preconceitos.

Como fazer isso?

Promovendo a diversidade, o olhar respeitoso, solidário e generoso para todas as formas de orientação sexual. Um instrumento bem legal para isso é a Cultura, promover mostras de filmes, de peças de teatro e festivais literários de temática homossexual. Hoje em dia existem iniciativas do tipo, mas privadas. Isso deve ser feito como política pública também, a prefeitura também pode promover isso. Tem a área de esportes também, que pode fazer isso com idéias como, por exemplo, os Jogos da Diversidade (realizados em 24 de maio). Temos que incentivar e manter essa prática.

Esse movimento pode começar dentro da própria prefeitura.

Claro, com os servidores do município de modo geral, fazendo um programa de combate à discriminação e respeito à diversidade, principalmente para quem faz atendimento ao público.

Na rede de saúde, por exemplo, uma boa idéia é implantar unidades de saúde com atendimento mais especializado, mas sempre garantindo que em qualquer outra unidade todos sejam atendidos da mesma maneira.

Um passo importante é determinar o direito da pessoa fazer seu registro no sistema com o nome pelo qual ela se identifica. Queremos que essas pessoas tenham uma vida normal na sociedade. Para uma Juliana, ser chamada de João Pedro na hora do atendimento pode ser humilhação, são detalhes que fazem a diferença.

Outro ponto importante está na área de assistência e desenvolvimento social. Os LGBTIs são uma população vulnerável, sujeita à violência. No caso das travestis que fazem programa na rua e dos gays que vivem em situação de rua complica ainda mais.

Eles ficam em condições ainda piores do que as dos outros gays, também discriminados. Um exemplo é na hora de conseguir vaga em albergue público, é importante garantir vaga para todos, independente da orientação sexual de cada um.

E como tirar essa população da rua?

Elaborando programas de capacitação, de geração de emprego e renda. Conheço várias travestis que não querem fazer programa, querem ser recepcionistas, secretárias, professoras, advogadas.

Defendo o fomento à criação de cooperativas de travestis de prestação de serviços em outras áreas, organizar esse grupo para ele ter mais força nessa questão. Mas é preciso também oferecer atendimento terapêutico aos LGBTIs. Vivemos em uma cidade cheia de problemas de equilíbrio mental, são milhões de neuróticos, inclusive eu, eu pago terapia (risos). Vivemos sob muita pressão, com medo por vários motivos. Nos homossexuais, o medo é dobrado por causa do preconceito, das agressões e perseguições, onde tem que ter uma medida ostensiva de segurança para esses casos, com punições rigorosas.

Esse auxílio terapêutico seria no sentido de ajudar o homossexual a sair do armário, assumir sua orientação sexual para a família. É necessário promover um equilíbrio emocional, oferecer terapia para que eles se aceitem melhor, porque existem várias situações de conflito, estresse e insegurança muito fortes nesse momento de descoberta.

Quais ações efetivas a prefeitura pode fazer para combater o preconceito?

Pode-se criar mecanismos na prefeitura para, por exemplo, punir estabelecimentos onde acontece discriminação por orientação sexual. Eu tenho, inclusive, um projeto de lei em trâmite na Câmara que diz justamente isso.

O poder executivo pode fazer isso por iniciativa própria. Não é mandar fechar o estabelecimento, porque isso gera desemprego, mas o lugar tem que responder por essa falta de respeito. Funcionaria dando uma advertência na primeira infração para ele tomar alguma medida, na reincidência já é multa, se ele fizer de novo, uma multa mais pesada, isso até o fechamento do local por uma semana.

O correto é fazer uma coisa progressiva, para não penalizar 20 que perdem o emprego por causa de um. Podemos fazer também um certificado de bom tratamento, pessoas diferentes, mas tratamento igual. Isso pode ir parar na página da SPTurs como uma página especial para esses estabelecimentos amigos da diversidade.

No turismo tem muita coisa a ser feita. Em São Paulo, temos um turismo forte de gastronomia, compras e cultura, é ótimo incentivar essa boa acolhida do público LGBTI, incentivar os estabelecimentos não só no fim de semana da Parada, mas também ao longo do ano. Inclusive, dou o maior apoio à Parada, ela está incorporada na vida da cidade, é preciso que a prefeitura continue apoiando, dando espaço, suporte institucional de tráfego e segurança, promover, divulgar. É um evento que tem um caráter de manifestação política e não partidária, em defesa de respeito, de igualdade e garantia de direitos.

Como suas propostas foram definidas? Você observou o quê para decidir por elas?

Defini essas propostas com a minha vivência e a partir das demandas da comunidade LGBTI, as pessoas foram me chamando a atenção para alguns problemas que eu não tinha tanta noção que existiam. Eu também fui aprendendo muitas coisas com o tempo. Por exemplo, as travestis não eram um grupo que eu conhecia bem, lidava bem, não sabia bem como atuar com elas. Elas me ensinaram, me chamaram atenção para a dificuldade que enfrenta quem não quer fazer programa, quem quer trabalhar em outros lugares que não as ruas. Então juntou a demanda concreta de quem está na minha frente com a minha vivência.

Fui aprendendo muito com a militância, com os movimentos. Você tem que perceber que vai precisar aprender a vida inteira, tem que lembrar que, como você tem que aprender, outras pessoas também precisam. Os parlamentares devem participar mais disso, não ficar com medo de perder eleitorado. Mas tem que ter paciência para que eles aprendam, explicar porque não é correto dizer opção sexual, levar isso para a vida deles. A gente sempre tem o quê aprender.

Na sua opinião, qual é o papel de um prefeito para com a comunidade LGBTI?

O dever de um prefeito é ver a população como um todo. As leis, embora tenham lacunas, prevêem que as pessoas têm direitos iguais, independente de raça, sexo, crença ou orientação sexual. É dever de um prefeito, seja qual for sua convicção pessoal, assegurar que todos tenham os mesmos direitos.

Sabendo que em função do preconceito, discriminação, conceitos distorcidos e noções equivocadas acontece a violência, que pessoas vivem sob ameaças, é dever do governante combater a violência, assegurar a segurança, dar oportunidade igual para todos serem felizes. É um dever dele, mesmo que o governante não concorde com a homossexualidade, que ache um erro, um desvio. Ele pode achar, mas isso não dá a ele o direito de desrespeitar e ignorar o desrespeito, principalmente o prefeito, ele não pode não fazer nada para combater isso.

Qual a sua relação com o movimento gay? Como aprendeu a respeitá-lo?

Essa relação vem desde sempre, eu aprendi respeito em casa, minha mãe nunca deixou a gente discriminar alguém, torcer o nariz por ser homossexual, negro, português, alemão, mineiro, baiano. É desde cedo que se ensina. Ninguém nasce racista, o preconceito se aprende, é uma coisa que se ensina, às vezes até sem perceber, sem querer.

Sem dúvida é preciso ensinar as pessoas desde pequenas a respeitar umas às outras, independente de gostarem ou não do jeito da outra pessoa, do jeito que ela anda, de quem ela gosta. A criança tem que saber que é errado desrespeitar os outros. Por isso bato na tecla de ensinar isso na escola, por meio da educação.

Mas você pode enfrentar dificuldades para colocar esses planos em práticas, como vereadores oposicionistas que podem trancar a votação dos projetos.

Sim, vai haver alguma dificuldade para fazer, mas o importante é que isso está amadurecendo. Por exemplo, temos hoje dentro da prefeitura a Coordenadoria de Assuntos da Diversidade Sexual (CADS) e o Centro de Referência da Diversidade (CRD), isso mostra que é possível arar a terra dura, mesmo tendo ainda muita terra dura que não está disposta a deixar frutificar a idéia do respeito.

JUVENTUDE

Como será o futuro do jovem atual?

Os jovens costumam levar a fama injusta de serem os menos interessados em política. Geralmente comparam os de hoje com os do anos 60 para concluir que aqueles eram engajados e os de hoje são alienados. Acho injusto. Os jovens são os mais interessados, os que mais se perguntam o que eu posso fazer e como. E nos oferecem a idéia de outras forma de organização e de militância. O futuro do jovem é construir cada vez mais outras forma de engajamento e de militância.

FIDELIDADE PARTIDÁRIA

O que acha da fidelidade partidária?

Acho que os partidos precisam ser fiéis a si mesmo, para começar. O troca-troca utilitarista é imperdóavel, mas algumas trocas são facilmente compreendidas.

MULHERES NA POLÍTICA

Você sofreu algum preconceito em ser mulher e apresentar um programa de esportes?

Ah, claro que sim, estranho seria se não sofresse! Teve gente que me mandou lavar roupa, voltar para o fogão - naturalmente, no momento em que fiz uma crítica ao seu time :o). Acontece. O preconceito é tão grande que tinha gente até que dizia: "Muito boa sua coluna. É você que escreve?". Agora já diminuiu muito.

Na sua opinião, por que em um país no qual mais de 50% do eleitorado é feminino, não há maior participação das mulheres em cargos públicos?

Em parte, por causa da tradição: não faz muito tempo que se admitiu que mulheres podiam votar e, principalmente, serem votadas. A imagem da política como algo masculino é muito mais antiga e ainda está muito cristalizada. Assim, para começar, você tem muitas mulheres que, mesmo sendo muito atuantes e exercendo papéis de liderança, não se vêem disputando um cargo eletivo. Ou seja, ainda é difícil ter candidatas em número significativo; os homens se oferecem em número muito maior. Some-se a isso a resistência de parte das eleitoras em confiar em uma mulher como sua representante e pronto: ficamos com 10% ou menos dos postos no Parlamento.

Você acha que a cultura brasileira não estimula o exercício do poder pelas mulheres? Por quê?

Acho que não; como eu disse, em parte é por força do costume, da tradição. Mulher na política ainda é uma idéia razoavelmente nova, e toda mudança de costume leva tempo para acontecer. Além disso, o papel "reservado" à mulher na sociedade modo geral é de um poder muito restrito, muito definido: sobre as crianças, por exemplo. Mulher pode ser mãe, professora, enfermeira, psicóloga... Mas o poder sobre outros homens, por incrível que pareça, ainda é meio tabu.

O que dificulta o envolvimento das mulheres em questões coletivas e na disputa por um cargo público?

Esses costumes e estereótipos que eu citei e questões práticas, como o fato de mulheres ainda acumularem muito mais a vida social, profissional e acadêmica com os os cuidados com a família do que os homens. Isso as torna menos disponíveis para uma empreitada desse tipo (e é uma senhora empreitada!)

Como você acha que a mulher é vista, perante a sociedade, estando ela no poder?

É uma visão meio ambígua. Por um lado, por estar na política e ser este um meio tão masculino, ela é vista um pouco como "heroína", isto é, alguém especial, valente, ungido com super-poderes (se é mulher está na política, só pode ser "f*dona"). Por outro, alguém que a qualquer momento pode ser tapeado, deixado para trás, porque continua sendo uma mulher e, por isso, mais fŕagil. Não sei se a famosa "sensibilidade feminina" é mais valorizada do que as qualidades que, supostamente, são mais masculinas...

Quais medidas poderiam ser adotadas para reverter o atual quadro feminino na política brasileira?

Não há nada melhor que aproximar a política das pessoas de modo geral, porque o grande problema hoje é o desinteresse, o desencanto, o desprezo. É difícil trazer novos quadros, porque quem está fora não quer entrar (e quem está dentro não quer sair!). Se for oferecida educação política para as pessoas, de modo que elas entendam o que é, como funciona, qual o papel e a importância da política, elas se sentirão mais interessadas e estimuladas a participar. Se a política for desmistificada, traduzida, tornada compreensível, se demonstrarmos que políticos não são "eles", personagens estereotipados e inamovíveis, mas sim qualquer pessoa que se disponha a tomar parte, poderá haver uma renovação e diversificação. E isso inevitavelmente incluirá as mulheres.

Você acha que o sistema de cota para mulheres, no qual obriga os partidos políticos a inscreverem, no mínimo, 30% de mulheres nas chapas, é eficiente? O que você pensa a respeito da obrigatoriedade de ter essa cota nos partidos políticos?

Todo sistema de cotas tem problemas; o que fazer se não houver mulheres suficientes para preencher a cota de candidatas, obrigar algumas a se candidatar contra a sua vontade? Mas todos são necessários, porque são a correção, na marra, de alguma distorção que não pode esperar décadas para ser resolvida. Não é uma correção perfeita, completa, mas ela força uma mudança mais rápida. Por causa da cota, os partidos têm de se preocupar em identificar, formar e estimular lideranças femininas – e, se não o fizerem, terão ao menos a obrigação de reservar um espaço para aquelas que tomarem a iniciativa de se apresentar como candidatas.


PASSADO, PRESENTE E FUTURO

Você é casada, tem filhos? Parece ser tão novinha!

Não estou mais casada e tenho 3 filhas: Rachel (24 anos), Sarah (21) e Julia (10).

Por que você quis entrar no mundo da política? O que te chama atenção nesse meio?

Eu sempre pensei em entrar, desde pequena. Acompanhava as discussões da minha mãe com o meu avô sobre ditadura, subversão, repressão, comunismo etc. super interessada, querendo entender e decidir de que lado eu estava. E como eu queria "mudar o mundo" - sonho infantil que ainda não abandonei... - achava que a política era um bom modo de tentar fazê-lo. Hoje o que me chama a atenção nesse meio é a quantidade de pessoas que entram com ideais e boas intenções e depois desistem deles... Não se tornam desonestas, mas não se insurgem contra a desonestidade como deveriam!

Por que exatamente o título "Jornalista Amiga da Criança" aplicado a você?

É um título que a Fundação Abrinq e a ANDI - Agência de Notícias dos Direitos da Infância - concede todo ano a jornalistas que, na avaliação deles, se destacaram na cobertura e defesa de direitos da criança e do adolescente. Pelo meu trabalho no Barraco MTV, um programa de debates que eu fazia, eles me concederam esse título. É um reconhecimento do trabalho e, ao mesmo tempo, uma renovação do compromisso com essa pauta.

Além da candidatura, quais são seu planos e projetos futuros?

Bom, SE eu não for prefeita (há esse risco... rsrs), tenho vários planos B... Um deles é montar um blog que acompanhe diariamente as atividades na Câmara Municipal, porque ninguém sabe direito o que acontece aqui, e a imprensa cobre ocasionalmente.

Também gostaria de ter um cargo de ouvidoria ou "ombudsman", trabalhando na administração para apontar seus próprios erros. Ao mesmo tempo, tenho vontade de passar 3 meses no semi-árido fazendo trabalho voluntário, sabe? Vou ver... (E tem o trabalho na TV e no jornal, a menos que não me queiram mais)

Qual é a maior diferença entre os partidos????

Boa pergunta! Às vezes é difícil responder! Teoricamente, tem uma diferença original de ideologia, de programa. Um (de esquerda) acha que o Estado tem um papel muito importante como promotor do desenvolvimento, justiça, igualdade; outro (de direita) acha que o Estado só atrapalha, que o mercado se organiza sozinho para oferecer o que as pessoas precisam. (Estou fazendo definições meio toscas, pra encurtar). Na prática, mistura tudo! Fazem alianças sem nenhuma coerência com ideologia e programa... Se no governo, defendem que "vale tudo" pra governar; se na oposição, acham que têm de meter o pau em tudo o que o governo faz... Em todos eles, em número maior ou menor, têm pessoas que discordam disso tudo e tentam fazer as coisas direito... Quanto maior o partido, infelizmente é mais difícil ter coerência e consistência, e essas vozes mais sensatas desaparecem na multidão... É duro, viu!

Soninha, prefere a política ou o futebol? (rsrs...)

Futebol é muito, mas muito mais divertido! Mas não tem nada mais importante na minha vida hoje do que a política. Pela importância que ela tem no mundo - maior até do que a do futebol (rsrs)

Sente saudades da MTV? Onde foi o melhor lugar que já trabalhou?

Como eu fiquei MUITO tempo na MTV e saí de lá quando já estava enjoada de tanto brigar lá dentro (nossa, parece até que estou falando do PT, rsrs), não tenho saudade não... Foi muito, muito legal, mas eu me matei de trabalhar lá, e nem sempre ficava feliz com os rumos da TV... E os amigos que eu tinha naquela época continuam meus amigos, então tudo bem.

O melhor lugar que já trabalhei? Vixe, não sei. Todos tinham problemas, mas em todos eu fui feliz. MTV, TV Cultura, Cultura Inglesa (dei aula lá!). Ah, já sei, acho que o que fica mais próximo dos meus ideais é mesmo a ESPN...

Eu sei que todos os políticos (com boas intenções) tem a vontade de mundar o mundo. Você tem essa expectativa, claro que mudar o mundo no sentido daquilo que está ao seu alcance, né!?

Putz, tenho mesmo. Se não for pra "mudar o mundo", esse mundo tão cheio de problemas graves que a gente conhece, pra que entrar na política?? Você não pode ter expectativas exageradas, não pode menosprezar os problemas e dificuldades, mas tem de tentar fazer o que estiver ao seu alcance. O que deixa a gente desanimado às vezes é ver quantas pessoas nem tentam mais... Se acomodam, acham que é assim mesmo e sempre vai ser... Bom, se você não fizer nada pra mudar, aí é que não muda mesmo!!

Soninha, tem algum livro que mudou a sua vida e que você indicaria como leitura obrigatória? Se sim, por quê?

Difícil pensar em um livro só, porque a minha vida foi soterrada por livros, eu leio o tempo todo, e não sei apontar um só... Mas tem, por exemplo, a coleção Para Gostar de Ler, que me apresentou cronistas muito legais que tinham uma visão crítica do mundo e ao mesmo tempo uma sensibilidade para as pessoas comuns, os detalhes da vida cotidiana... Acho que esse respeito ao personagem que cada pessoa é no mundo me inspira até hoje. Pensar em como as grandes coisas interferem na "pequena" vida das pessoas. (Ah, os quatro eram: Fernando Sabino, Carlos Drummond, Rubem Braga e Paulo Mendes Campos). E tem os livros sobre budismo... Mas esses vieram bem depois.

Soninha, você teria outro(a) filho(a) se se casasse de novo?

Embora eu adore ter filhos, não, não teria mais... Eu já tenho 40 anos, e me faltaria energia pra começar tudo de novo com uma criança pequena (precisa ter muita energia!). Mas uma das minhas frustrações é não ter adotado um filho... Agora não daria, porque eu passo tempo demais na rua. Mas talvez um dia eu ainda realize esse plano.

Você tem um sonho de consumo? E um profissional?

Sonho de consumo? Eu adoraria ter uma casa bem legal, com quintal, árvores, jardim de inverno... E queria viajar muito pelo Brasil e pelo mundo... O profissional, o maior de todos, seria ser prefeita. Mas o fato de ser candidata já é a realização de um sonho.